Capa - Sarau

Capa - Sarau
Sarau Equinócio de outono

quarta-feira, 20 de março de 2013

Que abraço


Depois que o tempo despediu da manhã
E passou a andar de mãos com a tarde.
O mundo se envolve no calor do dia
Que a manhã iniciou entre silêncio, pássaros,
Automóveis, orquestra filarmônica MG.
Depois de um concerto na brisa matutina da liberdade
Ter concertado a rítmica das ondas sonoras da manhã.
Desce um homem a avenida
Entre tantas as ruas que traçam a Av. Bias Fortes.
Ele ouve um mendigo cantar, e cantava assim:
“Quando mais você me abraça, mais eu quero ter você”
Aquele homem morador de rua sem camisa com uma calça surrada, velha,
Trabalhava numa riqueza minuciosamente
Na calma dos seus plásticos em pet’s
Reciclava tão bem a matéria para se sustentar
E talvez sem saber, fazia uma reciclagem íntima
Uma conta dele com a terra do zelo por esta que nos mantém em pé e alimentados.
Alimentados em carne viva e beleza da natureza.
Fico a imaginar, se aquele canto era só por cantar ou se ele estava expressando a voz de sua alma.
Pois qual seria o abraço que aquele mendigo queria?
Ele que é desolado de tantos afetos e calor humano
E vive desolado numa sociedade nua!
Queria um abraço de um amor?
Um abraço familiar e único e amigável?
Ou abraço de esperança, fé e compaixão pelo dia de amanhã?
Não sei, não parei para perguntá-lo “Qual o abraço mais forte você quer?”

Pego o ônibus a seguir meu retorno
Fundamento essencial da minha curta viagem.
Passamos por um túnel, digo, eu, os outros passageiros, motorista e trocador.
Naquele túnel escuro de lençóis frios.
Outro escraviza meu olhar a reparar a cena da vida.
Este apenas de bermuda se banhava no canto
Com uma água que despejava do teto do túnel,
Uma água que sei lá por quantas ruas já se deslizou até aquele corpo.
Se banhava como se estivesse em uma chuva
Que lavasse a lama da alma em suas impurezas e injúrias
E ele sorria sob aquela água suja.

Lembro de outros corpos por varias ruas deitados.
Vi apenas  uma mulher mais confortável
Que estava dormindo num sofá velho jogado na rua.
Dormia como uma angélica criança
Num leito tão sarcástico e humano.
Parecia não fazer parte desta realidade
E ao acordar seria um mundo diferente.
Mas diferente seria apenas um novo dia para ela.


Fico a pensar sobre nós humanos ricos em tantas coisas
Habituados a injúrias e vaidades em misérias
E nos cegamos que cada dia é um novo dia.
Estes três personagens principais do meu dia
Vivem com esplendor que não abraçamos.
Ah, eles cantam na rua a cantar
E deslocar do seu sofrer e abafar a lâmina triste que os fere,
Lâmina do frio e da fome.
Oh, eles se banham como se caísse sobre eles um brilho,
Águas límpidas de uma cachoeira
Ou a fantástica massagem e limpeza de uma chuva.
Uh, eles dormem como criança quando já são adultos
Num sono profundo cheio de sonhos
E flutuam longe das atrocidades do mundo.
E nós?
Reclamamos de cada manhã, cada suor de trabalho,
Agredimos a natureza em sã consciência,
Não cantamos nada nem que seja por engano.
E eu me ponho neste ‘nós’ para fortalecer este convite
E me tornar comum a todos
Perante o convite que a vida nos dá todos dias
A observá-la e admirá-la para nos reciclar.
Se reciclem mortais postos em esplendor!
Eu já estou me reciclando e vou me sujar muito,
Mas vou me abraçar muito mais do que se estivesse limpo!

segunda-feira, 11 de março de 2013

Mais um sarau


Mais um momento de parar a respiração,
Fixar o olhar em cada palavra,
Silenciar a cada vírgula,
Resguardar cada aprendizagem
E recolher tudo o que um texto ensina na força vadia das palavras.

Mais uma sensação para  a alma
Os estados dos seres humanos como a solidão,
A dor, o amor, a esperança, o ódio
E a amizade que são órgãos da nossa alma que serão sentidos em algum momento
Momento em que a alma vadia declama suas sensações.

Mais um compreender das finas palavras,
Elas são sempre inspiradoras
São uma grande reflexão e recolhimento íntimo
São fetos que crescem no nosso ouvir, no ler, no declamar, no conversar
E quando adultos são sintetizados os entendimentos, as teses, as verdades, as mentiras, a vida.

Mais um tempo para gerar vida.
Parem e ouça os poetas declamarem.
Deixem as beatas palavras vos acariciar.
Permitam as vadias palavras vos estuprarem
Neste sarau que se inicia em cada pensar do homem.

sábado, 2 de março de 2013

Lambuzar

Pega o doce na mesa, e sorria com um beijinho e com olhos de brigadeiros
Isso mesmo, se atreva criança, vá até a mesa
Desafia seus pais e aos olhos dos convidados
Pois é de vós o encanto da festa
E é para vós que a mesa é feita, enfeitada e adocicada.
Então cabe somente a vós a prioridade de se servir
De lambuzar a boca e as mãos com os quitutes
Lambuze nas tradições puritanas da sociedade
É de vós, crianças,  os infinitos verbos da felicidade
Vamos logo, que é de nós o desejo de comer
e de nós é o saber da nossa satisfação
quando vejo crianças um ego quieto em mim quer logo ser elas
e quero comer os docinhos junto a elas
esperar até partir o bolo junto a elas
queria realmente ser elas e de novo elas.

Avancei por um poema a mesa dos sabores de ser poeta
Essa é uma recordação da criança que um dia fui em todo corpo e alma atrevida
Poetizando, comi todos os doces e cuspi na sociedade puritana e repreensora das crianças
Vamos logo cuspi mais e mais sendo elas, as crianças.